pR6nitSNH08tQNpWPA5eZO9DQjdlskzknDPg03Ak5Q0=all-head-content'/> QUARTIER LATIN: Requiem por uma administração pública isenta

domingo, 4 de janeiro de 2009

Requiem por uma administração pública isenta




De facto, o Estado é simultaneamente o topo da administração pública e o governo.
O que siginifica materializar, também simultaneamente, a lógica do serviço (funcional e tecnocrática) e a lógica representativa (clientelar e partidocrática).
Só que depois, como há apenas um corpus a suportar tudo isso (o funcionalismo público) as coisas não são, na realidade, separáveis.
E não propriamente porque a promiscuidade invista todos estes actores numa relação cúmplice, perversa e conspirativa. Mas porque interfere de facto com as condições do desempenho dos subordinados, não garantindo o império da lei do mérito, mas sim o da 'contingência do chefe'.
E aqui as armas ao alcance de cada um são profundamente desiguais.

- Ora, em que fica tudo isto no contexto da nova reforma?

Até agora, havia de facto algo de substancialmente diferente entre o mundo do emprego privado e o mundo do emprego público: um apertado controlo de legalidade.
Não tão grande, nem tão exemplar como todos gostariam (habituados que estamos a malhar e a desconfiar da coisa pública). Mas real, efectivo e inexorável.
Dirão os mais ingénuos que esses limites continuam. Pois é, formalmente continuam.
Mas quem lá está dentro sabe bem ao que ficaram realmente reduzidos a partir de 1 de Janeiro de 2009.
Porque até hoje nenhum "patrão", em qualquer microestrutura de Estado, tinha poder absoluto sobre a subsistência da relação laboral.
E tanto nos habituámos a considerar este aspecto como negativo (o vínculo tendencialmente vitalício) que nos esquecemos de olhar para os seus possíveios efeitos benéficos (ou os seus fundamentos).
Não, o mais importante não era, de facto, a tranquilidade da sobrevivência garantida.
Era antes o facto de, através da intocabilidade do vínculo, se garantir a intocabilidade do Estado.

A partir de agora, basta pensar:
- haverá alguma coisa mais poderosa do que o argumento da subsistência material do indivíduo?
- algum trabalhador se irá atrever, doravante, a pôr isso em causa?

Quer se queira quer não, a independência da administração pública face ao jogo político do momento está muito mais vulnerável desde o passado dia 1 de Janeiro.
Na realidade, está igual a qualquer empresa-chafarica de esquina, frágil e incógnita na sua insignificância; e igual a qualquer grande empresa SA, poderosa e opaca na sua magnitude avassaladora.

Eu, se fosse aos cidadãos portugueses em geral, não estava nada tranquila e tinha sérias razões para temer muito mais do que até hoje pelo alinhamento dos agentes públicos com os interesses superiores do Estado.

Esta é que é a verdade a que ninguém parece ligar:
- temos uma administração pública very up-dated por fora mas, por dentro, definitivamente ferida de morte na sua possível isenção.